Entenda como empresas e fundos da China, EUA e Cingapura adquirem milhões de hectares, os desafios para a soberania alimentar e o cenário legal por trás da compra de terras no Brasil
O Brasil, uma superpotência do agronegócio, tornou-se uma arena central para as ambições globais de segurança alimentar. Empresas e fundos de investimento da China, Estados Unidos e Cingapura, entre outros, realizam uma discreta compra de terras no Brasil, porém massiva, aquisição de terras no país. Este movimento visa garantir a produção de alimentos e commodities para suas nações, mas ocorre em meio a um intenso debate sobre soberania, sustentabilidade e desenvolvimento.
Entenda a complexa dinâmica por trás da compra de terras no Brasil por estrangeiros. Analisamos as estratégias, o volátil cenário regulatório e os impactos socioeconômicos e ambientais dessa crescente influência internacional em nosso território.
A fronteira agrícola brasileira na busca global por segurança alimentar
Com vastas extensões de terra arável, o Brasil é um ímã para o investimento internacional, inserindo-se na chamada “corrida mundial por terras”. Este fenômeno, intensificado pela crise de preços dos alimentos de 2008, leva nações dependentes de importação a buscar terras em outros países para garantir seu abastecimento.
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As aquisições, no entanto, são frequentemente “discretas”. Investidores utilizam estratégias sofisticadas para contornar restrições legais, como a formação de t ventures e estruturas acionárias complexas. O conceito de “control grabbing” (apropriação de controle) é chave: mesmo que a terra continue em nome de brasileiros, o controle sobre a produção e os lucros é exercido por entidades estrangeiras.
A incerteza na compra de terras no Brasil por estrangeiros
A regulamentação da propriedade de terras por estrangeiros no Brasil é marcada por uma longa história de ambiguidades. A principal norma é a Lei nº 5.709, de 1971, que impõe restrições à compra, como limites de área por município. No entanto, sua interpretação mudou ao longo do tempo.
Um parecer da Advocacia-Geral da União (AGU) em 2010 tornou as regras mais rígidas, equiparando empresas brasileiras com controle estrangeiro a estrangeiros. Essa decisão gerou insegurança jurídica e motivou a apresentação do Projeto de Lei 2.963/2019, que visa regulamentar o tema. Aprovado no Senado em 2020, o projeto continua em tramitação lenta na Câmara em 2025, prolongando a incerteza. Proponentes defendem que ele traria segurança para destravar investimentos, enquanto opositores temem riscos à soberania alimentar e ao meio ambiente.
Estratégias da China, EUA, Cingapura e outros investidores
Diferentes países e entidades empregam estratégias distintas na compra de terras no Brasil.
China: Através da gigante estatal Cofco International, a China foca na construção de cadeias de suprimentos integradas. A empresa investe pesadamente em infraestrutura, como portos e silos, para facilitar a exportação de soja, milho e açúcar brasileiros para o mercado chinês.
EUA: Investidores norte-americanos, incluindo fundos patrimoniais como o da Universidade de Harvard, têm adquirido terras agrícolas, principalmente no Cerrado (Matopiba). Esses investimentos, no entanto, já foram associados a controvérsias de desmatamento e grilagem de terras.
Cingapura: Sendo uma cidade-estado dependente da importação de alimentos, Cingapura vê o Brasil como um parceiro crucial. Seus fundos soberanos, como o GIC, investem de forma estratégica no agronegócio brasileiro, incluindo em empresas de insumos biológicos.
Outros: Fundos de pensão canadenses, como o PSP Investments, também marcam presença, geralmente através de parcerias e aquisição de participações minoritárias em empresas brasileiras de grãos, café e silvicultura.
Os impactos multifacetados da estrangeirização de terras
A crescente compra de terras no Brasil por estrangeiros gera consequências complexas e, por vezes, negativas.
Soberania alimentar: uma preocupação central é que o foco na produção de commodities para exportação possa minar a segurança alimentar interna, reduzindo áreas destinadas a alimentos para o mercado local.
Repercussões socioeconômicas: a demanda por parte de grandes investidores leva à inflação dos preços da terra, dificultando o o para pequenos agricultores brasileiros e programas de reforma agrária. Há também relatos de deslocamento de comunidades rurais e intensificação de conflitos agrários.
Pegada ambiental: a expansão agrícola em larga escala está diretamente ligada ao desmatamento em biomas críticos como a Amazônia e o Cerrado, à perda de biodiversidade e à pressão sobre os recursos hídricos.
O Brasil em uma encruzilhada entre investimento e soberania
Em 2025, o Brasil se encontra em uma encruzilhada. A compra de terras no Brasil por estrangeiros é um debate que opõe a necessidade de atrair investimentos e a urgência de proteger a soberania nacional, o meio ambiente e o bem-estar das populações rurais.
A falta de dados transparentes e de uma regulamentação clara e estável dificulta uma gestão eficaz do tema. Para avançar, o Brasil precisa de uma estratégia nacional coesa, que equilibre o desenvolvimento econômico com a salvaguarda de seus interesses estratégicos.
A forma como o país navegará essa complexa questão não apenas determinará seu futuro agrícola e alimentar, mas também servirá de referência para outras nações que enfrentam desafios semelhantes.