Inaugurada após 16 anos de obras e US$ 11 bilhões em investimentos, a Grand Central Madison é a estação de trem mais cara do mundo — mas enfrenta baixa movimentação em plena Manhattan. Entenda os bastidores dessa infraestrutura bilionária.
Quando o projeto da Grand Central Madison foi anunciado nos anos 2000, a proposta parecia grandiosa: construir a estação de trem mais cara do mundo no coração de Manhattan, sob a icônica Grand Central Terminal. A obra prometia resolver gargalos de mobilidade, conectar Long Island à parte leste da cidade e modernizar o sistema de transporte subterrâneo com padrões do século XXI.
Mas o que era para ser símbolo de eficiência, inovação e conectividade se transformou em um caso emblemático de infraestrutura bilionária que levou 16 anos para ser finalizada — e hoje, menos de dois anos após sua inauguração, ainda funciona quase vazia, com trens circulando com capacidade ociosa e plataformas subutilizadas.
A Grand Central Madison: o maior projeto ferroviário subterrâneo da história dos EUA
A estação foi construída como parte do projeto East Side Access, uma das obras públicas mais complexas e ambiciosas dos Estados Unidos. Ela ocupa 32 mil metros quadrados abaixo da Grand Central Terminal e estende-se por 14 níveis subterrâneos, o equivalente a 15 andares de profundidade — alguns localizados a mais de 55 metros abaixo da superfície.
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Segundo a Metropolitan Transportation Authority (MTA), o projeto envolveu a escavação de túneis de 13 km sob o East River, a instalação de sistemas de ventilação, sinalização de última geração, escadas rolantes de 60 metros e elevadores de alta velocidade.
O custo total: US$ 11,1 bilhões — tornando a Grand Central Madison, de acordo com o New York Times e a Federal Transit istration, a estação de trem mais cara do mundo.
Como uma obra bilionária levou 16 anos para ser concluída
O East Side Access começou a ser concebido ainda na década de 1990, mas as obras efetivamente começaram em 2006, com previsão de conclusão para 2013.
Ao longo dos anos, no entanto, o projeto foi acumulando atrasos, reorçamentos, mudanças de engenharia e disputas legais com empreiteiras, além de impactos logísticos imprevisíveis — como a supertempestade Sandy e a pandemia de COVID-19.
Documentos do próprio governo estadual e reportagens do The City e da Bloomberg revelaram uma série de problemas de gestão, ineficiências contratuais e duplicidade de cargos que inflaram o orçamento original em mais de 200%.
Ainda assim, em janeiro de 2023, a estação finalmente foi inaugurada ao público.
Uma estação de trem monumental — e quase deserta
Apesar do investimento bilionário, a Grand Central Madison não cumpre, até o momento, o que prometeu. As estimativas da MTA eram de que a estação receberia até 160 mil ageiros por dia vindos da Long Island Rail Road (LIRR), aliviando a sobrecarga em Penn Station. Mas os números reais têm sido significativamente menores: cerca de 30 a 40 mil usuários diários, segundo dados atualizados da MTA em 2024.
Nas imagens captadas por veículos como CNN, NY Daily News e pelo portal Curbed, é possível ver plataformas amplas, modernas, com sinalização digital e iluminação LED — mas quase vazias em horários que deveriam ser de pico.
Por que a baixa movimentação?
Especialistas em mobilidade urbana apontam diversos fatores:
- Mudança no perfil de trabalho após a pandemia: o home office reduziu drasticamente a necessidade de deslocamentos diários, especialmente entre Long Island e Manhattan.
- Falta de integração tarifária e logística: muitos ageiros ainda preferem a Penn Station por facilidade de o e conexão com outras linhas.
- Falta de comércio e serviços: a Grand Central Madison não conta com lojas, cafés ou conveniências que estimulem a permanência e circulação.
Segundo o urbanista Samuel I. Schwartz, ex-comissário de transportes de Nova York, “a estação foi pensada para um fluxo pré-pandemia. A realidade de hoje é outra, e a cidade ainda não adaptou sua malha ferroviária às novas demandas”.
Um monumento à engenharia subterrânea
Mesmo com os problemas de ocupação, ninguém contesta a grandiosidade da obra. A Grand Central Madison é uma verdadeira joia de engenharia. São mais de 20 escadas rolantes entre os níveis, paredes revestidas de granito, obras de arte permanentes da artista japonesa Yayoi Kusama, e um sistema de exaustão capaz de renovar completamente o ar da estação a cada poucos minutos.
Ela foi projetada para resistir a inundações, ataques biológicos e situações de emergência, com sistemas redundantes de energia, ventilação e comunicação. O investimento em infraestrutura energética é visível: toda a estação é alimentada por rede de alta tensão com geradores de backup e sensores automatizados.
De acordo com o presidente da MTA, Janno Lieber, “esta estação é uma conquista para o povo de Nova York e um o fundamental rumo à mobilidade do futuro”.
Quando a maior infraestrutura ferroviária encontra um problema de demanda
A Grand Central Madison escancara um dilema global enfrentado por governos e gestores públicos: como equilibrar grandes obras de infraestrutura com mudanças rápidas no comportamento social e tecnológico?
Assim como aeroportos foram esvaziados por apps de reunião virtual, e avenidas perderam carros para bicicletas e transportes por aplicativo, a mobilidade urbana do século XXI a por uma reconfiguração acelerada. Estações monumentais como a Grand Central Madison correm o risco de se tornarem infraestruturas subutilizadas, mesmo sendo tecnicamente perfeitas.
Impactos econômicos e retorno sobre investimento
Segundo a Bloomberg Green e relatórios da própria MTA, a estimativa era de que o projeto movimentasse até US$ 4 bilhões por ano em ganhos indiretos para a economia de Nova York, ao melhorar o o ao centro financeiro da cidade, estimular novos empreendimentos e valorizar imóveis na região leste de Manhattan.
Contudo, até o momento, esses efeitos são modestos. O impacto do abandono parcial das atividades presenciais em escritórios e o aumento da vacância de imóveis corporativos também reduziram a efetividade econômica da estação.
Com isso, cresce a pressão pública sobre o governo do estado para justificar a despesa de US$ 11 bilhões em uma estação que, até agora, não entrega o retorno esperado.
A comparação com outras megaestações do mundo
Em comparação com outras grandes estações globais, a Grand Central Madison tem o maior custo por metro quadrado já registrado. Para efeito de comparação:
- Berlin Hauptbahnhof (Alemanha): US$ 900 milhões
- Shinjuku Station (Japão): reformada por US$ 2,5 bilhões
- Gare du Nord (França): expansão orçada em US$ 1,6 bilhão
- Grand Central Madison (EUA): US$ 11,1 bilhões
Nenhuma dessas, contudo, apresenta o mesmo grau de subutilização tão logo após sua inauguração.
Os próximos os: requalificação ou erro irreversível?
A MTA já anunciou novos investimentos em sinalização digital e campanhas para estimular o uso da estação. Também estuda-se a concessão de áreas comerciais no interior da Grand Central Madison, com lojas, cafés e serviços, para tornar o ambiente mais atrativo.
Além disso, estão sendo revistos os horários de trens da LIRR para oferecer conexões mais rápidas e frequentes para a estação.
No entanto, analistas alertam que, sem uma política mais ampla de incentivo ao transporte público — como tarifas integradas, subsídios e revisão da malha urbana — a estação corre o risco de se tornar um símbolo de desperdício de recursos públicos, algo que já se discute no Legislativo do estado de Nova York.
A história da Grand Central Madison é um retrato emblemático dos desafios contemporâneos da infraestrutura bilionária em tempos de mudança acelerada. Apesar de ser a estação de trem mais cara do mundo, seu desempenho atual está muito aquém do planejado — levantando discussões sobre planejamento urbano, gestão pública e os rumos da mobilidade urbana no século XXI.
Projetada para ser um triunfo da engenharia, a estação agora precisa ser ressignificada para não se tornar um dos maiores fracassos operacionais da história moderna dos transportes.
Solução sempre existe e a própria matéria aponta o que é necessário para reverter o quadro. Não adianta fazer uma estação hiper moderna se o **** não atrai público. Integração para facilitar deslocamentos, preços íveis, pontos de serviços e comércios, atrações temporárias ou permanente… Bastaria os criadores da estação se espelharem em modelos de outras regiões, Estados ou Países. São Paulo é um bom exemplo.
Bom exemplo do quê?