Estudo liderado por Adam S. Green, na PNAS, usa o acervo arqueológico do projeto GINI para mostrar que amplas redes de trocas primeiro ampliam a produtividade e depois concentram riqueza, desafiando o otimismo clássico de Kuznets.
A tese de Simon Kuznets (1955) defendia que o desenvolvimento econômico eleva a desigualdade apenas nas primeiras fases, pois a prosperidade subsequente a reduziria.
Décadas de dados modernos mostraram que o “arco” proposto nem sempre se materializa; economias crescem mantendo ou até ampliando a concentração de renda.
Para testar a ideia em escalas maiores, Green integrou-se ao projeto GINI, que coleta medidas de casas escavadas em todo o mundo como proxy de riqueza.
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O banco inclui 53464 residências distribuídas por 1176 sítios entre 21000 a.C. e a atualidade, permitindo estimar produtividade (área média) e desigualdade (coeficiente de Gini) em longos intervalos.
Aplicar ferramentas econômicas a evidências materiais dá aos pesquisadores alcance temporal impossível para séries históricas convencionais.
O objetivo central: descobrir se ciclos de crescimento e igualdade observados por Kuznets se repetem, ou não, quando analisamos milênios de globalização “à moda antiga”.
Como surgem as “Marés de Kuznets” em três super-redes comerciais do ado
Os autores focaram em zonas onde o intercâmbio percorria distâncias continentais para suas épocas, formando “mundos” quase globais.
Na Bronze Age Interaction Zone (Oeste e Sul da Ásia, 3º-2º milênio a.C.), a expansão de pesos-padrão e rotas caravanistas coincide com queda inicial na desigualdade e salto na área média das casas.
Fenômeno semelhante aparece no Mundo Maya, onde cidades conectadas por longos sistemas de troca viram primeiro prosperidade difusa, depois acúmulo de poder nas elites clássicas.
A Bretanha pré-romana experimenta ganho produtivo e maior equilíbrio patrimonial com o comércio atlântico; já sob o Império Romano os domínios fundiários aristocráticos elevam abruptamente o Gini.
Esses picos e vales repetidos, batizados de “Kuznets’ Tides”, sugerem que regras de mercado inicialmente inclusivas podem ser capturadas por elites e revertidas em extração de riqueza.
O padrão cíclico contradiz a expectativa de convergência permanente de Kuznets: a maré sobe para todos, mas depois baixa para muitos enquanto continua subindo para poucos.
Lições para o desenvolvimento sustentável no século XXI
O comércio em escala mundial não é exclusivo da modernidade; suas consequências sociais seguem lógicas que já se manifestavam milênios atrás.
Fases de crescimento com baixa desigualdade coincidem com governança de mercado mais aberta, padronização de pesos, moedas e contratos íveis a múltiplos grupos.
Quando grupos s controlam essas mesmas instituições, surgem “altas marés” de concentração que, segundo o estudo, acabam sufocando a produtividade geral.
Green e colegas argumentam que políticas atuais de globalização podem aprender com essas métricas arqueológicas: manutenção de regras plurais e fiscalização contra monopólios são centrais para evitar o efeito-maré.
A pesquisa fornece um quadro empírico em larga escala para debates sobre trade-offs entre crescimento e equidade em protocolos comerciais como OMC, acordos regionais e cadeias globais de suprimento.
Conclusão dos autores: “Ao longo do tempo, desigualdade crescente frequentemente vira a maré contra o crescimento, encerrando ciclos de desenvolvimento sustentável.”