Entenda os desafios políticos, ambientais e financeiros que há décadas impedem a conclusão da rodovia que liga Manaus ao restante do país, uma verdadeira saga amazônica.
No coração da Amazônia, uma estrada vital para a integração nacional permanece um símbolo de promessas não cumpridas. A BR-319, única ligação terrestre entre Manaus e o resto do Brasil, desafia o progresso há mais de 40 anos. Entre trechos de lama e polêmicas ambientais, a pergunta persiste: por que esta importante br do Brasil nunca foi completamente pavimentada?
O que é a BR-319 e sua importância estratégica como BR do Brasil?
A BR-319 é uma rodovia federal com aproximadamente 885 km de extensão. Ela conecta Manaus, no Amazonas, a Porto Velho, em Rondônia. Em teoria, seria uma via crucial para o transporte de cargas, pessoas, alimentos e medicamentos. Na prática, a estrada encontra-se em estado precário. Longos trechos simplesmente não funcionam como rodovia.
O traçado da BR do Brasil cruza áreas remotas da floresta amazônica. Corta regiões de alta sensibilidade ambiental, incluindo reservas extrativistas e terras indígenas. É um corredor que, ao mesmo tempo que poderia conectar, isola milhões por falta de infraestrutura básica. O ponto mais crítico é o “trecho do meio”, com cerca de 405 km. Este segmento carece de pavimentação e sinalização. Possui pontes improvisadas de madeira e lamaçais intransitáveis no inverno amazônico. Motoristas enfrentam dias atolados e riscos constantes. O Canal Construction Time relata que viagens que deveriam durar 12 horas podem se estender por quatro ou cinco dias.
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A situação atual da rodovia: Um retrato segmentado
Atualmente, a BR-319 está longe de ser uma via contínua e funcional. Menos da metade da estrada possui pavimentação regular.
- Km 0 ao 198 (Manaus – Careiro da Várzea): Este trecho está totalmente asfaltado. É considerado em boa condição para trafegar.
- Km 198 ao 250 (Lote C): Obras de pavimentação foram iniciadas em 2021. O progresso é lento, com obstáculos que seguraram o avanço.
- Km 250 ao 655 (Trecho do Meio): Aqui reside o maior desafio. São aproximadamente 405 km sem asfalto contínuo, com terra batida e lama. As condições de tráfego são péssimas, especialmente durante as chuvas.
- Km 655 ao 885 (até Porto Velho): Os últimos 230 km são asfaltados. A qualidade é variável, e alguns pontos exigem manutenção, mas é um trecho trafegável. Essa descontinuidade no asfalto alimenta o apelido de “rodovia fantasma”.
Histórico da BR-319: Promessas, abandono e tentativas de retomada
A BR-319 nasceu no contexto do regime militar brasileiro, construída entre 1968 e 1973. Foi inaugurada em 1976 pelo presidente Ernesto Geisel. Sua missão era conectar Manaus a Porto Velho por terra, garantindo a soberania nacional na Amazônia. Também visava impulsionar a ocupação e facilitar o escoamento da produção.
Nos primeiros anos, a BR-319 chegou a ser totalmente asfaltada. Contudo, sucumbiu à falta de manutenção, chuvas intensas e solo instável. Na década de 1980, o trecho do meio ficou praticamente intransitável. A estrada foi abandonada. Diversos governos tentaram reativar a BR do Brasil. Em 1996, entrou no plano Brasil em Ação (governo FHC), sem avanços. Em 2007, no governo Lula, foi incluída no PAC, com recuperação de trechos nas extremidades. Em 2021, o governo Bolsonaro iniciou a pavimentação do Lote C. Porém, o projeto enfrentou críticas ambientais e disputas judiciais, resultando na suspensão das obras em 2024 por falhas no licenciamento e ausência de consulta a povos indígenas.
Hoje, a discussão ressurge com força. O governo federal incluiu a rodovia no Novo PAC. Propôs um modelo inédito de fiscalização ambiental. A principal barreira continua sendo o licenciamento ambiental, devido às unidades de conservação e terras indígenas. Ambientalistas temem aumento do desmatamento e crimes ambientais. Apesar disso, sua reativação poderia baratear o transporte para Manaus e integrar o norte ao país.
Esse não é um caso isolado, outras BRs do Brasil estão em condições precárias no Brasil
A BR-319 não está sozinha em sua precariedade. O Brasil possui outras rodovias em situação similar, ou até pior. A BR-156, no Amapá, liga Macapá a Oiapoque. Dos seus cerca de 800 km, aproximadamente 60% são asfaltados. O restante vira lama, isolando cidades.
Outro exemplo é a BR-242, que liga o oeste da Bahia ao Mato Grosso. Com mais de 2.300 km, é essencial para o agronegócio da região do Matopiba. Mesmo com sua importância econômica, trechos inteiros seguem sem asfalto, causando prejuízos. Assim como a BR-319, a BR-242 vive de promessas não cumpridas. Enquanto a BR-319, uma estratégica br do Brasil, enfrenta questões ambientais complexas, a BR-242 sofre com aparente abandono político, mesmo sendo vital para a economia.
Essas comparações mostram um problema maior: uma infraestrutura rodoviária marcada por abandono e falta de planejamento. O que une a BR-319, BR-156 e BR-242 é o cenário de terem sido pensadas para integrar o país, mas acabaram deixadas para trás.