Em meio a tensões comerciais crescentes, potências globais redefinem estratégias, constroem novas alianças e expõem fragilidades históricas, enquanto o mundo observa silenciosamente o surgimento de uma nova ordem internacional que promete transformar o equilíbrio geopolítico nas próximas décadas.
A intensificação da guerra de tarifas entre China e Estados Unidos está redesenhando os contornos da geopolítica global.
Enquanto Washington adota uma postura cada vez mais isolacionista, Pequim amplia sua influência com discursos pró-globalização e novas parcerias comerciais.
A União Europeia, por sua vez, perde protagonismo e busca alternativas para não ficar à margem das decisões internacionais.
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Especialistas alertam que a disputa não se resume a questões econômicas, mas representa uma profunda transformação nas relações de poder entre as principais potências mundiais.
China aposta na integração e em alianças estratégicas
A China tem intensificado esforços para se posicionar como uma potência aberta ao multilateralismo, enquanto os Estados Unidos se fecham em medidas protecionistas.
O presidente chinês, Xi Jinping, reforçou na última semana a importância de preservar a globalização econômica e de se opor ao unilateralismo, uma crítica direta à política americana.
Em um pronunciamento feito na sexta-feira (11), Xi destacou que o mundo deve “resistir conjuntamente à intimidação e manter a tendência de globalização econômica”.
A fala foi interpretada como um convite a outros países para que se juntem à China na resistência contra as barreiras comerciais impostas pelo governo dos EUA.
O líder chinês também vem ampliando laços com regiões estratégicas, como a América Latina, a África e a própria Europa.
Pequim demonstra um esforço coordenado para “conectar mercados” e construir pontes em um cenário cada vez mais fragmentado.
A guerra tarifária, nesse contexto, oferece à China a oportunidade de ocupar espaços deixados pelos Estados Unidos, especialmente em nações emergentes e blocos que valorizam o comércio internacional.
Estados Unidos adotam postura isolacionista e protecionista
Desde o início de seu segundo mandato, em dezembro, o presidente norte-americano Donald Trump tem intensificado a política do “America First”, apostando em medidas que afastam tanto mercados quanto cidadãos estrangeiros.
Decretos de restrição migratória, tarifas elevadas e o esvaziamento de organismos multilaterais são parte da estratégia de Trump para reposicionar os EUA no topo da hierarquia global — mesmo que isso custe parcerias históricas.
O chamado “tarifaço” imposto à China foi a mais recente demonstração dessa postura unilateral.
Especialistas avaliam que Trump busca remodelar a geopolítica global sem recorrer a guerras militares ou negociações diplomáticas tradicionais.
Roberto Uebel, professor de Relações Internacionais da ESPM e especialista em geopolítica, afirma que “essa é uma forma de Trump impor suas regras no tabuleiro mundial”.
Ele acredita que o governo americano está promovendo uma mudança nas estruturas do regime internacional com foco em poder direto e intimidação.
Em fevereiro, uma matéria da revista britânica The Economist classificou a política externa de Trump como “mafiosa”.
Segundo a publicação, o presidente norte-americano estaria quebrando os moldes da ordem internacional construída após a Segunda Guerra Mundial, impondo sua visão de mundo com práticas comparáveis às de Don Corleone, personagem do clássico “O Poderoso Chefão”.
A revista alertou que o planeta caminha rapidamente para um cenário em que “quem tem poder faz o que quer”, substituindo o multilateralismo por acordos bilaterais opacos e ameaças diretas.
União Europeia enfraquecida busca aproximação com a China
Diante do avanço da guerra comercial e da instabilidade no relacionamento com os Estados Unidos, a União Europeia tem sinalizado uma aproximação com a China.
A reunião entre Xi Jinping e o primeiro-ministro da Espanha, Pedro Sánchez, na última sexta-feira, é um sinal claro dessa reconfiguração.
Xi sugeriu que a UE se una à China na resistência ao protecionismo americano.
De acordo com Roberto Uebel, os europeus devem se alinhar a Pequim não por afinidade ideológica, mas por exclusão.
“Pela primeira vez em décadas, a União Europeia não dita mais as regras do jogo na geopolítica mundial”, afirmou Uebel.
A guerra na Ucrânia e a dependência energética do bloco europeu têm fragilizado ainda mais sua posição no cenário global.
A Europa, que antes exercia uma liderança discreta nos bastidores diplomáticos, agora luta para manter alguma influência frente às potências dominantes.
Sua proximidade com os EUA se deteriorou com o estilo agressivo de Trump, e a necessidade de se reinventar tornou-se urgente.
América Latina entra no radar chinês
Além da Europa, a China também vem aumentando sua presença na América Latina, tradicionalmente considerada zona de influência dos Estados Unidos.
Na mesma sexta-feira, o ministro do Comércio chinês conversou por telefone com o vice-presidente brasileiro, Geraldo Alckmin.
O diálogo teve como foco o fortalecimento de organismos multilaterais, como a Organização Mundial do Comércio (OMC), e o incentivo a acordos que favoreçam o comércio justo e global.
Essa movimentação demonstra o interesse de Pequim em expandir sua influência em países estratégicos do sul global, promovendo a imagem de uma liderança econômica benevolente e cooperativa.
A aproximação com o Brasil é um reflexo da estratégia chinesa de consolidar parcerias fora do eixo tradicional, especialmente em regiões com vasto potencial econômico e político.
Rumo a um mundo tripolar?
Com a intensificação das tensões e o reposicionamento das potências, especialistas já falam em uma transição rumo a uma nova ordem internacional tripolar.
Nesse cenário, o mundo aria a ser dominado por três grandes zonas de influência: Estados Unidos, China e Rússia.
Roberto Uebel destaca que a fragmentação da atual multipolaridade deve ceder espaço para blocos de poder mais bem definidos, com maior competição por recursos, influência e alinhamentos ideológicos.
“Essa deve ser uma mudança no regime internacional mais a longo prazo, mas que já está se desenhando”, afirmou.
A guerra tarifária é apenas uma das manifestações desse novo equilíbrio global.
Mais do que disputas comerciais, o mundo presencia uma verdadeira batalha por hegemonia, valores e controle das narrativas internacionais.
O que esperar do futuro?
A atual guerra de tarifas evidencia um movimento mais profundo de transição geopolítica.
Enquanto os Estados Unidos se fecham, a China se posiciona como alternativa viável e pragmática, buscando conquistar a confiança de nações que se sentem excluídas pelo sistema atual.
A União Europeia tenta se equilibrar, sem sucesso, entre os dois gigantes, enquanto outras regiões do planeta, como a América Latina, tornam-se peças-chave nesse xadrez global.
O cenário exige atenção e responsabilidade por parte dos líderes mundiais, pois as decisões de hoje moldarão o equilíbrio de poder nas próximas décadas.
A diplomacia, os acordos comerciais e a capacidade de articulação internacional serão fatores determinantes na consolidação da nova ordem mundial que está por vir.