Novo cimento inspirado em conchas é 17 vezes mais resistente. Descoberta pode transformar a engenharia civil e aumentar a durabilidade de obras
O cimento é parte essencial do mundo moderno. Prédios, pontes e estradas dependem dele. Mas esse material também carrega um peso ambiental enorme. A indústria do cimento é responsável por até 5% das emissões humanas de dióxido de carbono no planeta. Agora, uma pesquisa busca uma alternativa. Cientistas encontraram inspiração em um lugar incomum: conchas do mar.
A força escondida nas conchas
No centro dessa ideia está o nácar. Também chamado de madrepérola, esse material é conhecido pelo brilho e pela resistência. Ele reveste o interior de muitas conchas e serve como uma defesa natural contra rachaduras.
O segredo do nácar está em sua estrutura. Ele é formado por pequenos tabletes de aragonita — um mineral frágil — combinados com uma cola orgânica flexível. Quando a casca é pressionada, os tabletes escorregam uns sobre os outros, espalhando a força. Isso impede que a rachadura avance.
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Essa estrutura chamou a atenção do pesquisador Shashank Gupta, aluno de pós-graduação, e do professor Reza Moini, do Departamento de Engenharia Civil e Ambiental. Eles tentaram copiar essa ideia no cimento.
Como o cimento foi transformado
Para isso, os cientistas criaram folhas finas de pasta de cimento. Depois, usaram laser para fazer ranhuras hexagonais nas folhas. Essas marcas imitavam os tabletes de aragonita presentes no nácar. Em alguns casos, as ranhuras separavam totalmente a folha em pequenos blocos.
Esses blocos de cimento foram então unidos com um tipo de polímero — semelhante à borracha — que funcionava como a cola do nácar. Ele permitia que os blocos se movessem levemente. Esse movimento era suficiente para espalhar o estresse quando o cimento era forçado.
Um novo tipo de resistência
“Se pudermos projetar concreto para resistir à propagação de rachaduras, poderemos torná-lo mais resistente, seguro e durável“, disse o pesquisador Shashank Gupta, aluno de pós-graduação no laboratório de Reza Moini no Departamento de Engenharia Civil e Ambiental.
Os testes mostraram resultados animadores. O novo material resistiu muito melhor do que o cimento comum. Vigas feitas com cimento tradicional quebraram de forma brusca, com rachaduras grandes.
Já as vigas inspiradas no nácar desenvolveram pequenas rachaduras que se espalharam devagar. Elas dobraram mais antes de quebrar.
Os cientistas testaram três versões do material. A mais eficiente foi a que tinha tabletes totalmente separados. Essa versão ou 19 vezes mais tensão antes de quebrar e teve uma resistência à fratura 17 vezes maior do que o cimento tradicional.
O que torna isso especial
Normalmente, tentativas de reforçar o cimento envolvem mudar a composição química ou adicionar fibras. Isso costuma trazer somente pequenas melhorias. Neste caso, o ingrediente principal — o cimento Portland — quase não foi alterado. A inovação está na forma como o material foi estruturado.
“Nossa abordagem bioinspirada não é simplesmente imitar a microestrutura da natureza, mas aprender com os princípios subjacentes”, disse Moini. “Nós projetamos intencionalmente defeitos nos materiais frágeis como uma forma de torná-los mais fortes por design.“
Cimento e concreto costumam quebrar facilmente sob pressão. Isso é um problema em situações como impactos, terremotos ou desgaste com o tempo. A equipe de Moini encontrou uma maneira de enfrentar essa fraqueza reorganizando os elementos internos do cimento.
A pesquisa ainda está no início
Apesar dos bons resultados, a pesquisa ainda está nos estágios iniciais. Os testes foram feitos com pequenas amostras. Isso levanta questões sobre o uso em larga escala.
Uma dúvida é se o polímero vai resistir ao tempo, à umidade e ao frio. Também há o fator do custo. Se o novo material for muito caro, pode não valer a pena em comparação ao cimento comum.
Mesmo assim, a ideia tem potencial. O material pode ser usado em locais de alto risco, como construções sujeitas a terremotos ou estruturas que precisam aguentar impactos fortes.
A equipe acredita que o estudo é só o começo. “Estamos apenas arranhando a superfície; haverá inúmeras possibilidades de design para explorar e projetar as propriedades constitutivas dos materiais duros e macios, as interfaces e os aspectos geométricos que influenciam os efeitos fundamentais de tamanho nos materiais de construção”, conclui Moini.
O trabalho mostra que a natureza pode oferecer soluções valiosas para problemas modernos. E que, com criatividade e ciência, até mesmo uma simples concha pode ajudar a construir um mundo mais forte e sustentável.
Com informações de ZME Science.